A transição e a flexibilidade energéticas serão alguns dos temas abordados no painel “Rethinking Power Systems: Understanding Energy Flexibility” da EDP Business Summit 2021 – Leaders and Corporations committed to the Energy Transition, um evento digital com inscrição gratuita que decorre no próximo dia 17 de junho e no qual Sanda Tuzlic irá participar. Com 15 anos de experiência no setor da energia, faz assessoria às empresas no contexto de transição energética, reforma de mercado e transformação digital. Aproveitámos a presença desta especialista no evento para conversarmos e perceber em que ponto estamos nesta transição, quais são os maiores obstáculos e como estão a ser transpostos.
Como é que os consumidores podem ser envolvidos na transição energética? Estão motivados para desempenhar um papel importante nesta transição? Quais são as principais barreiras para a adoção de soluções com emissões zero? Para os consumidores particulares e também para as grandes empresas.
Os clientes são o coração da transição energética e esta só poderá ter sucesso se todos estivermos envolvidos. Estamos, como nunca, a ver clientes cada vez mais motivados pela sustentabilidade, e as empresas, no ecossistema de energia e não só, estão a sentir uma forte pressão para agir. Além disso, conforme as tecnologias sustentáveis evoluem e amadurecem, os clientes serão cada vez mais motivados pelo próprio negócio: a sustentabilidade faz cada vez mais faz sentido, não só social e ecologicamente, mas também financeiramente.
Como tal, o ímpeto crescente entre os consumidores oferece muitas oportunidades para uma maior participação. As tecnologias digitais e de energia comprovadas e emergentes, possuem um enorme potencial para oferecer aos consumidores novos serviços, melhores perceções e mais controlo. Essas oportunidades permitem que os clientes se envolvam pessoalmente e que tomem medidas concretas para ajudar a resolver os problemas climáticos urgentes.
No entanto, muitos consumidores (grandes e pequenos) ainda enfrentam muitos obstáculos para participar da transição energética. No estudo mais recente feito pela Accenture – New Energy Consumer Research – observámos quatro barreiras principais à adoção de soluções de energia com carbono zero:
• Muitas opções: os clientes sentem-se sobrecarregados com a ampla gama de opções de isolamento residencial, sistemas de energia renovável ou um veículo elétrico, e desejam soluções simples e personalizadas. Em muitos casos, ainda não sabem ou não têm certeza sobre os benefícios para a sua carteira e conforto, bem como para o meio ambiente. Para ter sucesso, as soluções devem ser simples e claras.
• Informações insuficientes: os clientes desejam uma visão melhor dos custos e benefícios reais das soluções de baixo carbono por parte de autoridades confiáveis. Também precisam de transparência sobre como os seus dados estão a ser usados, com quem são compartilhados e a capacidade de fazer as suas próprias escolhas.
• Falta de opções de financiamento: fundamentalmente, os clientes precisam de soluções acessíveis e de baixo carbono – sejam Veículos elétricos, parques solares PV, baterias, bombas de calor ou gestão de energia –, o que requer melhores soluções de financiamento.
• Incerteza sobre o uso de dados e privacidade: o papel crescente da tecnologia nas residências e empresas cria uma riqueza de dados com enorme potencial para envolver os consumidores na transição de energia e para adaptar novos serviços, mas esses benefícios precisam de ser equilibrados com a proteção da segurança e privacidade do indivíduo. Os fornecedores precisam de conquistar e manter a confiança dos clientes, para atendê-los de maneira eficaz.
Como é que os fornecedores de energia podem promover e incentivar a adoção de soluções de emissão zero?
O fornecedor de energia pode ajudar a superar as barreiras existentes, agindo como parceiro confiável. Para cumprir essa função, é necessário monitorizar o desenvolvimento da tecnologia, para fornecer aos consumidores as soluções mais eficazes e relevantes. As tecnologias digitais e de energia comprovadas e emergentes possuem um enorme potencial para oferecer aos consumidores novos serviços, melhores perceções e mais controle: os medidores inteligentes são apenas o começo. A proliferação de dispositivos conectados – incluindo eletrodomésticos, tecnologia móvel e de informática, bombas de calor e veículos elétricos – aumenta radicalmente o potencial de otimização da procura. As empresas de energia podem ajudar os consumidores a usar o poder da nova tecnologia para reduzir complicações e custos, aumentando o controlo e obtendo novas receitas, como por exemplo, da venda de sua própria eletricidade. Cada vez mais, o poder da tecnologia pode tornar os novos serviços de energia muito simples para os consumidores, mesmo que o funcionamento subjacente seja extremamente complexo. A resposta à procura é um exemplo disso. A complexidade tecnológica e organizacional de fornecer serviços de resposta à procura para o mercado de flexibilidade de eletricidade[1] é irrelevante para a maioria dos consumidores, desde que eles controlem e beneficiem desse impacto nas suas contas de energia. Os fornecedores de energia têm um papel crítico a desempenhar na conceção de serviços e ofertas fáceis de usar, confirmando uma experiência de procura-resposta simples e intuitiva.
Como superar a intermitência das energias renováveis?
A intermitência renovável está a levar a uma necessidade clara e crescente de flexibilidade no sistema elétrico europeu – com mais de €8 mil milhões de gastos no segmento de flexibilidade de energia europeu[2] em 2020. O setor está a ser desafiado a encontrar novas maneiras de combinar a oferta e a procura. Isso exigirá um uso mais amplo de soluções atuais comprovadas, bem como novas fontes de flexibilidade, como veículos elétricos, levando a um potencial muito maior de participação do lado da procura, para atender às necessidades de flexibilidade da rede.
Pensa que os países da União Europeia (UE) – e particularmente Portugal – estão no caminho certo para cumprir os ambiciosos objetivos fixados pela UE para 2050? Ainda há muito a ser feito?
A Europa está no centro da mudança com muitos mercados – como a Dinamarca, Portugal, a Irlanda, a Espanha, a Alemanha e o Reino Unido – já excedendo 20% de renováveis variáveis anuais no seu mix de geração. Em 2030, projeta-se que a Europa alcance 55% da parcela de energias renováveis variáveis e mais de 70% do total de energias renováveis no seu mix de geração. As redes de transmissão e distribuição, assim como os mercados de energia, devem ser transformados para apoiar o aumento dos recursos variáveis, através de uma maior interconexão da rede europeia, com mercados de equilíbrio conectados e harmonizados e a participação de recursos de energia distribuída nesses mercados.
Para alcançar a neutralidade carbónica, com 100% de produção de eletricidade renovável e emissões líquidas neutras, deve haver um sistema de energia integrado[3]. Isto implica a eletrificação em grande escala de edifícios, dos transportes e da indústria, o que exigirá um aumento de produção de eletricidade sem emissões. Para setores mais difíceis, como o transporte de mercadorias e indústrias pesadas, serão necessárias outras soluções além da eletricidade, como o hidrogénio. À medida que o sistema se torna cada vez mais integrado, a colaboração intersectorial das partes interessadas é fundamental para conduzir a níveis mais elevados de eficiência do sistema, ao mesmo tempo que coloca os consumidores no centro da transição energética.